segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Olho para o relógio. Nove da manhã. Eu não deveria ter vindo, a cadeira é dura. Busco na mochila o caderno, mas o material ainda é o de ontem. Não importa, me sinto como ontem, me sinto como amanhã. Segunda, terça, quarta, quinta, sexta, segunda. São todos iguais, distingo-os pelo que vejo pela janela. Hoje tem sol, ontem nublou. Seguro o bocejo, não quero estampar o tédio no meu rosto. Não consigo, mas o professor nem vê, ele nem me vê. Ele não vê ninguém. Não vê Camila, nem Rodrigo, nem Tiago, nem Letícia. Ele vê Fulanos e Beltranas e talvez ele mesmo em um espelho imaginário. Concentro por um instante, mas logo vejo que preciso cortar as unhas, comprar pão, levar a vó no médico. Olho para um lado, a colega busca as pontas duplas do cabelo. Não deve ter nenhuma, ela já procurou ontem, procurou semana passada. Do outro lado, o colega desenha no caderno algo que não consigo decifrar. Aperto os olhos, o que estou procurando mesmo? Passam as pessoas pela janela, eu as acompanho com o olhar, elas se perdem dentro dos prédios. Acaba aula, acaba. Ela vai acabar, eu sei, o desejo é inevitável. Ela vai acabar, eu vou comer, vou ao banheiro, vou para outra aula, almoço em casa, etc. E aí vou deitar. E é tudo tão igual que eu acho que o esquisito ali da esquerda faz tudo igual também e afinal nem existe gente esquisita. Somos todos iguais. Eu queria ser ator ou dono de zoológico, como são surreais os sonhos das crianças. Faculdade, casamento, filhos, talvez um intercâmbio aí no meio, ou um divórcio. A menina ali bem da frente levanta a mão e comenta que a narrativa intimista do livro deixa de fora uma concretude necessária à descrição de um momento histórico cujos personagens... fome. A tênue linha entre a fome e o tédio. Olho para o relógio, o professor levanta a voz, busca entra a sua platéia um rosto mais interessado. Desvio de seu olhar com uma falsa anotação, ele faz uma pergunta para aquele cara que está mais no fundo dormindo. Alguns riem, outros fazem cara de indignação. O professor fala mais alto, o colega não sabe responder, mas se tem uma coisa que ele sabe é que o colesterol faz mal à saúde, que temos que nos exercitar pelo menos três vezes por semana, comer pouco sal, pouco açúcar, fazer de tudo para ter uma velhice plena. Olho para o relógio mais uma vez, que horas eram antes? Agora são nove horas e quinze minutos. Vejo que os colegas já deram início a mais um dos nossos rituais, me pergunto se na China ou no Egito os alunos fazem o mesmo, começam a guardar seus pertences para mostrar ao professor que está na hora de ele encerrar o seu solilóquio. E eu mais uma vez lembro que acordei já sabendo como iria terminar o dia, sabia como seria a aula, que o mais inesperado ao longo do dia e ao longo dos meus dias é o sabor do café, amargo ou doce. A impressão que tenho é que a rotina se agarrou às minhas entranhas como uma parasita, sugando as minhas forças, deixando o banal. Fecho meus olhos esperando enxergar um mapa traçado, meus dias todos contados, mas estranhamente me deparo com nada. Coloco a mochila no ombro, esse ombro dói, passo para o esquerdo, talvez eu vá ao banheiro antes de comer alguma coisa. Olho para os lados, todos já estão nervosamente checando os seus celulares. Tudo segue o seu curso e a volta é sempre de 360 graus. Garanto que aqui não sou o único a pensar: Emma Bovary c’est moi.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Pontuação

Na tentativa de responder todas as interrogações, acabei com muitas reticências.

domingo, 28 de março de 2010

Daydreamer.

And when I miss you
I close my I eyes and I see you.
Your smile makes me smile
Your laugh makes me laugh
And my tears they all dry
And I am happy one more time.

quarta-feira, 24 de março de 2010

Indiferença

Ver, mas não ver. Não sentir, só desdenhar. Ouvir, mas não ouvir
É o estado de graça das criaturas não-superiores e não-psicopatas.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Fading Away

Quando acordei, já não o encontrei. Ainda sonolenta, tateei o seu lado na cama e os lençóis nem estavam mais deformados pelo peso do seu corpo. Esfreguei os olhos tentando melhorar a visão ainda embaçada e sentei-me na cama. Busquei-o pelo quarto pouco iluminado e certifiquei-me da sua ausência. Incrédula, fechei os olhos e aspirei com força para que o seu cheiro, único e inconfundível, pudesse penetrar as minhas narinas. Entretanto, nada senti. E nada mais senti, nem angústia, nem desespero, parecia que a sua partida era algo natural e a incredulidade tornou-se conformismo. Andei pela casa e nela não havia mais nada dele. Seu riso, sua voz e seu cheiro haviam sido engolidos pela sobriedade da rotina. Em mais uma tentativa de encontrar-lo, cerrei os olhos e busquei-o em meus pensamentos. Sua imagem já embaçada e confusa ia, pouco a pouco, desfigurando-se e direcionando-se lentamente para os locais mais recônditos da minha memória.