domingo, 9 de agosto de 2009

O amor é estranho

Pratos voavam e porta-retratos eram atirados pela janela. Essa era uma cena já conhecida pelos vizinhos do jovem casal que costumava ser assunto constante para os fofoqueiros de plantão do prédio onde viviam. As brigas eram recorrentes e aconteciam pelos mais variados motivos, certa vez tinha sido porque ele chegara em casa bêbado depois de uma reunião com amigos, outra vez tinha sido o celular que ela tinha esquecido desligado, etc. Entretanto, os desentendimentos sumiam tal qual surgiam, porque após pouco tempo, geralmente no mesmo dia, era possível ver o casal sair apaixonada e alegremente do prédio, sempre de mãos dadas e com cumplicidade no olhar.
O choro borrava a maquiagem da moça, a qual cerrava os punhos de tanta raiva. Era ela quem tentava arremessar pratos na cabeça do namorado enquanto ele se esquivava com habilidade – já era expert nesse esporte. Naquele momento, os porta-retratos já estavam no chão e ele sabia que a síndica faria questão de levar a multa pessoalmente dessa vez. Ele tentava acalmar a namorada, dizendo que o e-mail que ela tinha lido era antigo, que ele não se comunicava com a ex há muito tempo, mas seus esforços pareciam ineficazes e ele temia que eles alcançassem o próximo nível – o das roupas tiradas do guarda-roupa. Ela gritava e ele já nem entendia o que ela falava, ele concordava – sim, ele era um imbecil – e dizia que a amava mais que tudo, mas reiterava que nada tinha acontecido. Isso era o que mais a aborrecia: a teimosia. Se ele admitisse que estava errado, tudo ficaria bem. Mas não, ele nunca estava errado e a histérica era ela. Isso ela não admitia.
Passadas algumas horas – aquela briga estava sendo feia, pensavam os vizinhos – ela aceitou a explicação do namorado. Ele suspirou e agradeceu a Deus a santa paciência com a qual tinha sido presenteado, enquanto ela agradecia pela virtude da tolerância que tinha recebido. Eles sempre terminavam essas discussões, se é que se pode incluir violência à mobília e a objetos de decoração no conceito de discussão, sem realmente concordar com coisa alguma. Naquele caso, ela havia resolvido acreditar nele enquanto ele se considerava vitorioso por se fazer acreditar. Não, ela não achava que o e-mail era antigo e não, ele não achava que ela estava certa em dar atenção àquele assunto. Eles apenas decidiam que estava na hora de parar e assim o faziam. Eles, então, se abraçaram, ele enxugou as lágrimas do rosto dela e ela o beijou com fervor. Eles sabiam que a cena se repetiria, que os papéis se inverteriam ou que permaneceriam os mesmos. Isso era o que mantinha nele a vontade de sempre voltar para casa para encontrar a namorada, furiosa ou não, e que mantinha nela o desejo de o encontrar fielmente no final de cada dia, teimoso ou não. E assim eles saíram de casa de mãos dadas, se olhando apaixonadamente, para, mais uma vez, comprarem um conjunto de pratos.

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